quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Um país de assimetrias

Vivemos numa época conturbada, num contexto de pós-crise assolado por desigualdades. Um estudo elaborado pela OCDE (Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico) e recentemente divulgado constatou que metade dos seus 34 países-membros viram agravadas as assimetrias entre as suas regiões desde o início da crise, em 2008. As desigualdades regionais são o resultado de uma multiplicidade de fatores, designadamente,  mutações sociais e económicas mais recentes e desvantagens decorrentes do isolamento geográfico.
Atualmente, os padrões de vida continuam a divergir em muitos países, obrigando as regiões mais pobres a lutarem para recuperar o atraso relativamente às mais ricas.
Portugal ocupa um lugar de destaque neste estudo da OCDE já que apresenta a sétima maior disparidade regional em termos de PIB per capita. Contudo, o "gap" entre as nossas regiões mais pobres e ricas até sofreu uma redução em virtude da crise. As regiões mais pobres viram o seu nível de pobreza aumentar e as mais ricas viram o seu nível de riqueza diminuir.
É certo que as desigualdades regionais sempre existiram, no entanto, a crise agravou de forma notória este problema. De facto, a desigualdade aumentou mais do que nos 12 últimos anos. 
O relatório da OCDE revela que em 10 países mais de 40% do aumento nacional do desemprego desde o início da crise foi concentrado numa só região. No caso dos países do ajustamento, Portugal, Irlanda e Grécia, o desemprego das áreas metropolitanas foi o maior.
Em Portugal, as maiores taxas de desemprego registaram-se no Algarve e em Lisboa, sendo estas duas regiões com grande expressão a nível económico. Na capital, a afluência da massa trabalhadora é avassaladora e é lá que as oportunidades se concentram. A crise retirou muitas das oportunidades prometidas. A insolvência de muitas empresas, a par da enorme queda no investimento, foram responsáveis pelo atual cenário, que levou ao desemprego massivo. Também o Algarve se ressentiu com a  crise, mas neste caso foi sobretudo a diminuição do inicialmente verificada no número de turistas e a estagnação do investimento que não permitiram continuar a impulsionar o turismo. Pode dizer-se que as alterações estão intimamente relacionadas com a especialização regional da atividade económica.
Os dados da OCDE demonstram ainda que Portugal é o oitavo país com maior diferença entre os níveis de produtividade regional. Esta informação nada tem de surpreendente, pois é do conhecimento geral que a maior parte dos fundos  são canalizados para as grandes áreas, Lisboa e Porto, onde os interesses se concentram e residem. 
Apesar do litoral Norte ter um peso muito importante nas exportações totais do país e contribuir significativamente para a criação de riqueza nacional, tende a ser subvalorizado. O Norte é a área onde o índice de pobreza e o número de beneficiários de do Rendimento Social de Inserção (RSI) registam os valores mais elevados. Mesmo perante tantas adversidades, cidades como Braga conseguem suplantar-se ao panorama adverso nacional e destacar-se pelo empreendedorismo, pela cultura, pela ciência e pela criatividade. Regiões como esta precisam de maior investimento público para continuarem a seguir as suas estratégias de desenvolvimento promissor.
Portugal não se resume a Lisboa e Porto. Portugal é muito mais que isso. Nesse sentido, é portanto necessário canalizar fundos para as regiões que mais precisam, com o intuito de favorecer o crescimento económico, de criar mais postos de trabalho, de corrigir carências no domínio das infraestruturas, de combater a pobreza, de aumentar a produtividade... Portugal é um país bastante centralizado e, como consequência, a distribuição dos fundos pelas diversas regiões nem sempre é feita da maneira mais justa, por falta de conhecimento da sua especificidade. Deste modo, cabe também aos governos locais fazer uma melhor gestão do seu orçamento e aproveitar os recursos regionais. De acordo com a OCDE: "Cidades bem administradas podem melhorar a eficiência e a produtividade dentro das suas fronteiras e nas áreas vizinhas".
Em suma, Portugal é um país de contraste e diversidade nos vários contextos físico e humano, apresentando, no entanto, identidade como país. O processo e ritmo de desenvolvimento não são homogéneos em todo o território português, verificando-se fortes disparidades regionais. O contexto atual demarcou estas assimetrias, podendo mesmo dizer-se que "o motor de convergência regional estagnou desde a crise". Na minha opinião, torna-se agora  necessária a adoção de políticas que diminuam estas desigualdades e a alocação de fundos para as regiões mais empobrecidas de forma a estimular o seu desenvolvimento. É altura de trabalhar para a convergência regional.

Ana Luísa Neves dos Santos

http://expresso.sapo.pt

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho] 

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