segunda-feira, 19 de novembro de 2012

“A arte de pelar o Ganso”1

"Não posso obrigar ninguém a ser patriota, mas posso obrigar a pagar imposto." (Campos Sales)

O sistema de tributação não é uma consequência da evolução das sociedades nem dos sistemas económicos uma vez que, embora com termos mais arcaicos, já estava implementado nas sociedades mais antigas (Egipto por exemplo), passando pelos impérios e monarquias e sobrevivendo até aos correntes dias.
Um dos papéis fundamentais de um Estado é o da sua competência financeira. Está intrínseco que o Estado tem de obter meios necessários à satisfação das necessidades colectivas de uma sociedade, sejam estas de saúde, educação, segurança (…). Para tal, o Estado deve criar uma Receita Pública, que advém de taxas, coimas, multas, empréstimos públicos, proveitos de bens patrimoniais do Estado, mas, e de facto, os impostos têm neste contexto uma importância acrescida, quer pelo peso que têm (que é muito grande na receita pública) mas também porque têm natureza de politicas económicas e sociais.
Sabemos que um imposto é diferente de uma taxa. Um imposto é uma prestação coactiva (dado que a obrigação de pagar um imposto não resulta de um acordo/contracto entre um particular e o Estado, a obrigação de pagar um imposto não resulta de um acordo/contracto entre um particular e o Estado, a obrigação de pagar é imposta independentemente da sua vontade), pecuniária, definitiva, unilateral, estabelecida pela lei, a favor de entidades que exerçam funções públicas, para satisfação de fins públicos, isto é, necessidades colectivas.
Neste contexto, a principal diferença entre um imposto e uma extorsão é a sua legalidade de cobrança, no sentido em que, se um Estado quiser simplesmente cobrar impostos aos seus contribuintes, pode e fá-lo.
É importante frisar que de facto haverá impostos cuja cobrança é de fácil entendimento e  pelos quais “o ganso até dará de bom grado as penas sem que se ouça um ai”. Se eu comprar um bem ou um serviço, é compreensível pagar um imposto. Existe, tal como nas taxas uma contrapartida. E até vejo viável a imposição de um imposto em períodos como o que hoje vivemos, ou quando se trata de uma imposição para correcções de externalidades. É importante termos, a nível individual, uma consciencialização social e global, em curtos e períodos pontuais. Contudo, e mais uma vez refiro, tirando excepções acima mencionadas, não concordo com a cobrança de certos impostos, nomeadamente a tipologia de impostos directos. Abordarei a questão dando dois exemplos em concreto.
Analisemos em primeira instância a tributação do património imobiliário através do IMI (Imposto Municipal sobre Imóveis). Este imposto está presente nos países mais desenvolvidos, havendo mesmo países cuja taxa de IMI é superior ao de Portugal, contudo, a meu ver, é um imposto que os governos gostam de aplicar porque conseguem receitas fáceis, na medida em que é difícil fugir a um imposto de uma propriedade, uma vez que esta está à vista de todos. Mas trata-se de múltiplas taxações! Quando eu compro ou construo uma casa, eu pago impostos (IVA) de todas as matérias e mão-de-obra consumida. Eu quero, eu pago. Se preciso de água, luz, saneamento, recolha de lixo (…), eu pago o serviço, as respectivas taxas à autarquia! Se precisar de algo, ou ajuda, até para a construção de um muro ou passeio, exigido pelas autarquias, eu não tenho qualquer apoio. A casa é uma propriedade fixa, ou seja, não implica nenhum desgaste num bem público, e mesmo o próprio encargo do desgaste do edifício é assumido pelo seu proprietário, salvo excepções de fachadas históricas em que as autarquias têm como responsabilidade auxiliar o proprietário em preservar.
O desaparecimento deste imposto é contra-argumentado por uns, na medida em que dizem que os ricos podem pagar mais que os pobres. Logo, é justificável. Questiono, então, não são todos os impostos dados por ponderações tendo em conta os rendimentos? A um nível de equidade, quer ricos quer pobres pagam, sendo claro que em resultado final os ricos acabam por pagar mais na medida que os seus bens, à priori, terão uma avaliação superior à dos mais pobres. Mas também é certo que às vezes, para aos mais desfavorecidos, custa mais pagar pouco do que muito a ricos! A inexistência deste imposto mantém a equidade em todas as classes.
Um outro aspecto de salientar sobre este imposto, é que o IMI recai sobre a riqueza, prejudicando apenas quem poupa ou compra casa.
Analisemos agora um outro exemplo: os impostos que um veículo encarrega. Um veículo em Portugal tem múltiplas taxações, sendo algumas impostos. Portugal é dos poucos países da UE em que se paga o ISV (Imposto sobre Veículos), e o IVA sobre o ISV, tornando os veículos por vezes o dobro do preço de certos países europeus. Todos os anos ainda pagamos o IUC (Imposto Único de Circulação). Ou seja, só o facto de ter um veículo já nos obriga ao pagamento de três impostos. Caso tiremos utilidade do mesmo, que é para isso que o compramos, ainda pagamos portagens, gasolina, seguros, tudo isto tendo uma parcela de impostos/taxas. Fora da equação estão outros serviços que teremos obrigatoriamente de utilizar e que também estes nos serão taxados de impostos. Ou seja, num só bem, neste caso veículo, existem inúmeras taxas! Eu compreendo que sendo este um bem que, ao contrário dos bens mobiliários, causa desgaste em bens públicos, nomeadamente das estradas públicas, sem falar a nível ambiental. Mas também é usurpar um individuo com múltiplos impostos. Existem países desenvolvidos, em que se se aplica o ISV e IUC e os condutores não pagam portagens, porque as receitas vindas desses dois impostos serão utilizadas para as manutenções das estradas.
Estes são meros dois exemplos em que por vezes o Estado defende a implementação de impostos de forma a criar receita (fácil). Seria mais vantajoso se em vez de aumentar a despesa dos seus contribuintes, simplesmente por aumentar, pensasse em medidas de rentabilizar as suas receitas, diminuir as suas despesas. Porque mesmo em situações de crise, assistimos a um Estado que ainda vai “esbanjando” receitas em Ex-Governantes, em ajudas de custo a (um número exagerado de) deputados (quando estes vão para um cargo de livre vontade e um professor por exemplo se colocado noutra extremidade do pais não tem qualquer apoio e nem recusar pode), mas que não se acanha em aumentar impostos!

Joana Raquel Carvalheira

1- Expressão baseada da citação de John Garland Pollard “O imposto é a arte de pelar o ganso fazendo-o gritar o menos possível e obtendo a maior quantidade de penas”

[artigo de opinião desenvolvido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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