quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Portugal e o Ajustamento Externo

Todos os dias ouvimos dizer que as exportações são a saída da crise e que o seu comportamento tem vindo a superar todas as expectativas. Para quem segue os meios de informação económica em Portugal, o tema tem sido amplamente exposto e debatido. A questão é até que ponto o ajustamento externo português se está a conduzir pelo aumento das exportações ou pela redução das importações.
Admitir que as exportações se estão a comportar de forma excecional como tem vindo a ser, repetidamente, vendido pela comunicação social, leva-nos a crer que Portugal tem conseguido sobressair na conjuntura internacional como um novo tigre asiático numa versão europeia. Na verdade, olhando para os dados da Organização Internacional do Comércio e comparando com os dados do Banco de Portugal, verificamos que o crescimento das exportações (-10,9%-2009; 8,8%-2010; 7,4%-2011) não tem superado significativamente o crescimento do comércio internacional (-12%-2009; 13,8%-2010; 5%-2011). Analisando ano a ano, verificamos que, se em 2009 Portugal regrediu menos do que as trocas internacionais, em 2010 o resultado inverte-se, possivelmente pela menor rapidez de ajustamento aos choques externos da economia portuguesa. De facto, Portugal tem vindo a superar os resultados internacionais desde 2011, contudo este facto pode ser, em parte, explicado pela recessão interna e pelo deslocamento da oferta do mercado interno para o mercado externo. Isto significa não só que Portugal não tem vindo a ganhar cota nos mercados internacionais, como, também, que está significativamente exposto às flutuações do comércio internacional.
Ora, se as nossas exportações têm seguido, grosso modo, as flutuações internacionais, podemos acreditar que não resistirão no momento em que a atividade internacional recue. Acreditando nestes dados, e constatando a entrada dos nossos principais parceiros comerciais em processos de consolidação orçamental e, consequentemente, em contração no seu mercado interno, podemos antever a diluição da força exportadora que se verificou nos últimos anos, algo que, de resto, já é possível observar. Os esforços de deslocação da oferta para os mercados emergentes têm sido notórios, são bem-vindos, mas não é credível que sejam capazes de suportar o agregado quando países como a Espanha, que representa 25% da procura externa, entrarem em recessão.
Especular sobre a evolução das exportações portuguesas leva-nos a tocar no investimento e, em particular, no investimento em empresas exportadoras. Embora tenha vindo a aumentar o crédito a este tipo de entidades, ele representa apenas cerca de 5% do crédito total disponibilizado pelo sector financeiro, nos últimos anos, e mesmo décadas. Com um nível tão baixo de investimento neste sector exportador, e com os aumentos de produção que tem tido, não é difícil imaginar que estaremos próximos dos limites da capacidade produtiva destas empresas.
Passando a uma análise dos dados existentes, sobre o comportamento das exportações, este ano verifica-se que têm vindo a ser sustentadas de forma consistente pelos Lubrificantes e combustíveis, com um crescimento 44%. Tendo em conta que Portugal conta com apenas uma empresa a realizar refinação e exportação de produtos refinados, a partir das duas refinarias existentes, compreendemos que tal como no mercado interno, no mercado externo, Portugal mantém uma economia extremamente cefálica.
Ao contrário das exportações, que não são controladas diretamente pela ação dos agentes internos, as importações refletem de forma no mínimo interessante o comportamento destes agentes perante a conjuntura. Assim, analisando os dados do Banco de Portugal constatamos que os portugueses decidiram conter de forma significativa a despesa em bens duradouros, sendo que, destes, o material de transporte, onde se inclui os automóveis, reduziu mais de 25% em termos homólogos até julho.
Outra componente das importações a sofrer uma forte contração é, previsivelmente, os bens de consumo final. Embora com menor expressão do que a rubrica anterior, as importações deste tipo de bens contraíram-se 4,8% no primeiro semestre, seguindo a contração do consumo interno. Curiosamente, no meio de uma diminuição global de 5,6%, há uma rúbrica que revela um crescimento significativo, trata-se novamente dos combustíveis e lubrificantes, com um crescimento de 13% e, obviamente, fortemente suportados pelo aumento de 44% das exportações desta rubrica. Algo que realça o efeito acumulado de redução das outras componentes.
Embora se possa argumentar que em termos relativos as exportações tenham vindo a crescer mais do que as importações, é importante recordar neste tipo de análise que, em termos nominais, a contração verificada nas importações é semelhante ao aumento das exportações. E este facto não é de somenos importância já que o diferencial entre os dois agregados era de cerca de metade do valor das exportações no ano passado.
Concluímos assim que o processo de ajustamento português está fortemente dependente das vaiáveis externas, e que apesar do esforço de deslocação das exportações para fora da UE, somos especialmente dependentes dos nossos parceiros comerciais europeus e da evolução do seu mercado interno. A evolução das exportações deve ser louvada, contudo, segue um padrão mundial sem se evidenciar de todo a nível global. O nosso tecido produtivo continua extremamente cefálico com um reduzido número de empresas a concentrarem uma componente muito significativa do bolo das exportações e a absorverem uma fatia excessiva do crédito disponível, impedindo investimentos no aumento da capacidade produtiva. Para além dessa componente externa, há um violento processo de ajustamento interno com uma redução brutal do consumo, que tem contribuído pelo menos de forma tão intensa como as exportações para a diminuição do nosso défice externo.

Hugo Pereira

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho] 

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