segunda-feira, 7 de maio de 2012

Tratado Orçamental Europeu

Foi por estarem “conscientes da sua obrigação, enquanto Estados-Membros da União Europeia, de considerarem as suas políticas económicas uma questão de interesse comum” e “desejosos de promover condições favoráveis a um crescimento económico mais forte na União Europeia e de desenvolver para o efeito uma coordenação cada vez mais estreita das políticas económicas na área do euro”1, que 25 dos 27 Estados-Membros da União Europeia assinaram o Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária.
Este tratado estabelece normas orçamentais que devem ser, na ordem jurídica interna do país, de carácter vinculativo e permanente e que definem que o défice estrutural não poderá exceder os 0,5% do PIB nem a dívida pública os 60%. Numa fase de transição, é pedido aos países com dívida acima do limite que a reduzam a uma taxa média de um vigésimo por ano. O não cumprimento do contratualizado pode levar a sanções automáticas até 0,1% do PIB, o que, para Portugal, representa cerca de 160 milhões de euros.
Em Portugal, o tratado foi apresentado como uma inevitabilidade, até porque a “concessão de assistência financeira no quadro de novos programas ao abrigo do Mecanismo Europeu de Estabilidade ficará condicionada, a partir de 1 de Março de 2013, à (sua) ratificação”1.
Sem questionar a necessidade de haver uma maior integração a nível orçamental na União Europeia, questiono os moldes em que a solução apresentada se desenha.
Neste tratado, em vez de se buscar a coordenação económica, há uma desconsideração completa pelas especificidades de cada país, no que toca, por exemplo, ao nível e às capacidades de desenvolvimento, tentando-se estabelecer critérios universais irrealistas. Além disso, é um tratado centrado numa preocupação com resultados nominais que apenas servem os interesses dos mercados financeiros, deixando-se as pessoas em segundo plano e descurando-se o incentivo ao crescimento e o combate ao desemprego. Não menos importante é a dificuldade que é criada para aplicar medidas orçamentais contra-cíclicas em períodos de agravada recessão económica.
Adicionalmente, alerto para a existência de uma lacuna de legitimidade democrática na forma como está a ser colocado este tratado. Sendo tão importante a nível europeu, seria de esperar que o Parlamento Europeu, o único órgão supranacional eleito por sufrágio directo, tivesse sido chamado a ratificá-lo. Não foi!
Por outro lado, “ao contrário dos tratados europeus, que só podem vigorar depois de ratificados por todos os Estados-Membros, o novo tratado foi negociado e elaborado à margem da UE e, para prevenir eventuais surpresas, foi decidido que poderá entrar em vigor logo que seja ratificado por 12 dos 25 signatários”2, ficando comprometida a necessidade de consenso. Finalmente, o mecanismo que será accionado em caso de não cumprimento das metas estabelecidas, “compreende a obrigação de a Parte Contratante em causa aplicar medidas para corrigir o desvio dentro de um determinado prazo”1, o que se materializa numa perda de soberania dos Estados, que, por sua vez, não é contraposta por um aumento da legitimidade democrática dos órgãos supranacionais.
Não creio que exista, no panorama actual, uma solução exequível e sustentável para a crise na Europa que não passe por uma integração orçamental. Acredito, no entanto, que a solução poderia ser procurada num programa mais centrado em questões como o desemprego e na situação real da economia, com soluções adaptadas às várias realidades nacionais, implementado por um Ministro das Finanças, ou mesmo um Governo supranacional, eleito por sufrágio directo.
Contudo, estamos perante um tratado que coloca Alemanha e França no controlo dos orçamentos nacionais de todos os Estados-Membros e assume metas de convergência nominal irrealistas. É neste contexto que me pergunto: depois da aplicação deste tratado, por quanto tempo as populações dos países periféricos se deixarão governar por pessoas que não elegeram? Será este o princípio do fim do mais longo período de paz na Europa?

Luís Nuno Barbosa

[1] Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária
[2] Renascença, 15 de Abril de 2012

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho] 

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